Uma das perguntas que me mais me colocaram no ano passado quando publiquei o livro Grandes Mistérios da História de Portugal prendeu-se com o processo de descoberta dos 14 episódios ali narrados. Provavelmente essa mesma questão ser-me-á colocada quando lançar o próximo livro (se tudo correr bem, este verão) com mais estórias curiosas, misteriosas, bizarras da história do nosso país. Para quem não tem prática na investigação (histórica ou jornalística), este poderá ser um verdadeiro mistério.
Não há qualquer segredo, mas também não há uma fórmula, muito menos mágica. O processo de investigação depende de múltiplos factores, alguns dos quais não controlamos, e não é linear. O plano que eventualmente tracemos inicialmente nem sempre será cumprido, e isso não é obrigatoriamente mau.
Antes de iniciar a investigação para o Grandes Mistérios da História de Portugal, elaborei uma lista com episódios que queria explorar. À medida que fui analisando as fontes disponíveis, algumas foram abandonadas e outras acrescentadas.
Devemos ter consciência de que nem sempre será possível escavar uma estória tão a fundo quanto desejávamos. Por não existirem fontes suficientes que a sustentem ou por a estória em si se esgotar em poucas páginas. Quando isto acontece, podemos reler o texto e perceber que aspectos da estória podem ainda ser explorados, e revisitar as fontes.
Numa primeira leitura, poder-nos-ão escapar informações que, embora não fundamentais, podem ajudar a compor melhor o texto. Ou, então, contextualizar a época histórica em que a estória ocorreu.
Não havendo uma fórmula mágica para descobrir histórias misteriosas, da minha prática, julgo importante conjugarem-se três condições para levar esta tarefa a bom porto:
Quando gostamos muito de algo, parece que tudo corre melhor, e que os contratempos que naturalmente vão surgir são mais facilmente ultrapassados. Investigar obriga-nos a passar muitas horas (muitos dias, semanas, meses) em arquivos e bibliotecas, e nem todos são locais agradáveis, e nem todos têm horários de funcionamento ajustados ao ritmo que queremos imprimir ao nosso trabalho.
Felizmente, hoje, há muitos arquivos digitais, e há que não descurar a procura de fontes em arquivos internacionais (vai surpreender-se com o que encontrará). Investigar pode ser um trabalho solitário (mesmo quando se está a trabalhar em equipa), e que nos obriga a investir tempo também a reflectir. Gostar (mesmo muito) deste trabalho é essencial para que tudo corra bem;
Ter bem definido aquilo que queremos encontrar é muito importante. Ter isso sempre presente quando analisamos as fontes, também. Tanto para o Grandes Mistérios da História de Portugal como para o livro que estou a escrever, utilizei fontes que já tinha consultado anteriormente.
No entanto, como o meu foco era outro, estas estórias acabaram por escapar ao meu olhar. Elas sempres estiveram lá, mas eu não as vi, porque a minha atenção estava concentrada num outro assunto. O foco é essencial, mas não deve ser tão apertado que não nos permita ver o que se passa à volta.
Por vezes encontramos outras estórias interessantes que poderão ser aproveitados para outros projectos. Algumas das estórias que tenho encontrado estão a ser divulgadas no jornal Faktual;
Se tivermos tempo suficiente, uma vez (aparentemente) terminada a escrita da estória, devemos deixá-la repousar. Ao retomá-la (uma, duas, três semanas depois), devemos lê-la como se fosse a primeira vez e verificar se há perguntas ainda sem resposta. Ser curioso, neste caso, é muito positivo. Querer saber mais, e mais, e mais ajuda-nos a ir à procura de novas fontes, o que pode ser muito enriquecedor para o nosso trabalho. Sabe aquelas crianças que estão sempre a perguntar porquê, porquê, porquê? Devemos fazer o mesmo exercício.
Estes são, para mim, as três principais condições que devem estar reunidas para iniciar a descoberta de estórias misteriosas, curiosas e bizarras. A partir daqui, só pode correr bem.